
Em entrevista ao programa Primeira Página no Ar, da São Carlos FM (107,9), na manhã desta sexta-feira (26), o biólogo e consultor ambiental Fernando Magnani fez um alerta contundente sobre os efeitos devastadores das queimadas na fauna e flora da região. Ex-diretor do Parque Ecológico de São Carlos por mais de três décadas, Magnani ressaltou que o problema vai muito além da destruição vegetal. “Nos incêndios, temos perdas imediatas e também contínuas. Pequenos animais morrem queimados ou intoxicados, enquanto os maiores, ao fugirem das áreas atingidas, enfrentam a fome, atropelamentos e conflitos com áreas urbanas”.
Durante a entrevista, o especialista destacou a importância do trabalho do promotor de Justiça, Flávio Okamoto, que vem atuando firmemente contra crimes ambientais. “É impressionante ver a promotoria reunindo entidades, cobrando ações e, quando necessário, levando à responsabilização criminal. O caso recente do homem preso por atear fogo próximo ao Parque Fehr mostra que a lei está sendo aplicada”, disse Magnani.
Segundo o biólogo, espécies como lobos-guarás, tamanduás e onças são as mais impactadas, não apenas pelo fogo, mas pela escassez de alimento e pela exposição em rodovias. “Muitos animais acabam indo para as estradas, atraídos por grãos caídos de caminhões. Nessa busca, tornam-se vítimas de atropelamentos. É um ciclo perverso”, explicou. Ele lembrou ainda que animais como tatus, ao se esconderem em tocas, muitas vezes morrem intoxicados pela fumaça.
Magnani também ressaltou que São Carlos está localizada em uma zona de transição de biomas – Cerrado, Mata Atlântica e Floresta Estacional – o que torna a região especialmente rica em biodiversidade. “Apesar das perdas ao longo das décadas, ainda temos um patrimônio ambiental valioso. Cabe ao poder público e à sociedade preservá-lo”, reforçou.
Um dos pontos centrais levantados por Magnani foi a necessidade de educação ambiental desde cedo. Ele citou como exemplo campanhas realizadas contra o tráfico de animais, em que crianças passaram a questionar e até denunciar parentes que mantinham papagaios em casa. “As crianças são verdadeiras multiplicadoras. Se o pai joga lixo na rua, é o filho quem alerta. É esse processo que precisamos estimular”, afirmou.
No entanto, o biólogo criticou o comportamento de parte da população em relação ao lixo. Apesar da existência de ecopontos em São Carlos, ainda é comum o descarte irregular em terrenos baldios, margens de rios e áreas de preservação. “É inadmissível ver pessoas transportando colchões ou restos de construção para jogar em beiras de matas, quando há estrutura gratuita para recebimento. Isso mostra que o problema está muito mais na mentalidade da geração atual e anterior do que nos jovens, que já vêm com outra visão sobre reciclagem e descarte correto”, pontuou.
Ao ser questionado sobre espécies em risco de extinção no município, Magnani destacou a Araucária, árvore símbolo da cidade, que já não encontra mais condições ideais de reprodução em razão da mudança climática. “O tempo da Araucária em São Carlos passou. O clima mudou, os invernos não são mais os mesmos, e isso compromete sua sobrevivência. Infelizmente, ficará restrita à memória, aos símbolos e ao brasão da cidade”, lamentou.
Entre os animais, o lobo-guará é o mais afetado, sofrendo com atropelamentos e doenças como a sarna, transmitida por cães soltos na zona rural. “É preciso um olhar atento e políticas eficazes para preservar a fauna que ainda temos”, alertou.
O especialista também apontou o potencial do turismo ecológico como alternativa para valorizar o patrimônio ambiental local. Ele citou exemplos de cidades vizinhas, como Brotas e Analândia, que transformaram suas riquezas naturais em atrativos turísticos. “São Carlos tem áreas fantásticas, como a região do 29, que poderiam ser exploradas de forma responsável, aliando preservação e geração de renda”, sugeriu.
Magnani encerrou a entrevista reforçando que todos os problemas discutidos – queimadas, lixo, atropelamentos e perda de biodiversidade – têm um ponto em comum: a necessidade de educação ambiental contínua. “Não existe preservação sem educação. Só assim conseguiremos garantir que as próximas gerações recebam uma cidade sustentável, e não um depósito de lixo e cinzas”, concluiu.
Ouça a entrevista completa de Fernando Magnani abaixo: