Em uma manhã marcada por emoção, reflexão e compromisso social, a chefe de sessão de Políticas para Promoção da Igualdade Racial, Carmelita Maria da Silva, concedeu uma entrevista profunda e didática ao jornal Primeira Página no Ar, da São Carlos FM [107.9], nesta véspera do Dia da Consciência Negra. Entre relatos pessoais, memória histórica e a defesa de políticas públicas, Carmelita reforçou a importância da data e o papel transformador da educação, da cultura e da representatividade.
Segundo Carmelita, as atividades em torno do 20 de novembro já mobilizam a população desde o fim de semana, com destaque para a apresentação da Família Silva no CEMAC, onde uma produção artística totalmente assinada por profissionais negros emocionou o público. “Foi difícil sair de lá”, contou.
Ela também destacou o protagonismo do Centro Afro Municipal, que hoje acumula mais de 870 visitas mesmo sem campanha de divulgação, tornando-se referência regional para estudantes, pesquisadores e moradores interessados na história afro-brasileira. “Agora o espaço está muito bonito, muito didático e repleto de significado.”
Racismo cotidiano, educação e políticas públicas
Entre as declarações mais fortes, Carmelita revisitou episódios pessoais e familiares que revelam o peso histórico do racismo no Brasil. Ao lembrar da mãe, uma cantora lírica e regente negra nascida em 1921, emocionou-se ao relatar situações de segregação enfrentadas por ela – inclusive a existência de banheiros separados. “O problema é que a cor chega primeiro”, afirmou.
Ela ressaltou que, apesar dos avanços, o racismo estrutural ainda se manifesta de forma “comportamental e silenciosa”, sobretudo em abordagens, oportunidades de trabalho e relações sociais. Mas destacou o papel da educação como ferramenta de transformação, lembrando que São Carlos foi a primeira cidade do Brasil a implementar a Lei 10.639, que exige o ensino de história e cultura afro-brasileira nas escolas. “Essa nova geração será mais consciente e engajada”, disse.
Carmelita também avaliou positivamente o trabalho do Ministério da Igualdade Racial, hoje mais próximo dos municípios e aberto ao diálogo. Segundo ela, a articulação nacional tem fortalecido casas e espaços de referência em várias cidades do interior paulista.
A entrevistada revelou ainda que está em andamento a preparação para uma travessia simbólica internacional, que levará representantes de várias cidades — incluindo São Carlos — para refazer com dignidade o trajeto da diáspora africana: Santos, Rio de Janeiro, Salvador e, por fim, África.
A viagem, segundo Carmelita, será “emocionalmente desafiadora”, mas também essencial para reconstruir memórias e compreender a dimensão da violência histórica da escravidão. “É uma ferida aberta. Enquanto houver racismo, nós vamos falar dele”, declarou.
Marcha do Dia da Consciência Negra
A programação continua nesta quinta-feira, 20, com a tradicional Marcha da Consciência Negra, que sairá às 8h do Centro Afro, na Rua Alexandrina, 844, em direção ao Grêmio Recreativo Flor de Maio.
O clube, que possui história e simbolismo para a comunidade negra, foi palco da última Conferência Municipal da Igualdade Racial e segue ativo, embora enfrente desafios. “É um lugar que carrega memória e resistência”, reforçou Carmelita.
Ao encerrar a entrevista, Carmelita deixou um recado direto aos ouvintes. “Somos todos iguais. A única diferença está na cor da nossa pele, mas nós estamos todos juntos e misturados. E ainda precisamos combater essa ferida aberta chamada racismo.”
A entrevista terminou com uma lembrança histórica deixada no estúdio. “Kemet, nome original do Egito, significa ‘terra negra’. Um povo que sempre teve orgulho de sua cor e de sua história”. São Carlos entra, assim, no 20 de novembro com reflexão aprofundada, memória viva e compromisso renovado com a igualdade.
Ouça a entrevista na íntegra:

















